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quarta-feira, 18 de agosto de 2010

Quase Literatura, quase Poesia, quase Pobreza…

No passado dia 15, publicamos aqui um bonito texto sobre a Pobreza, de joão-luís de medeiros, um açoriano radicado nos EUA, “sacado” do blogue da RTP-Açores, mas em que era preciso pedir autorização para a sua publicação. Assim procedemos, tendo recebido do autor, não só a autorização devida, como se deu ao trabalho de rever o Memorandum e nos enviar, hoje, agradecido.
É de salientar o gesto e a disponibilidade (disponibilidade que encontramos em muitas mais gente do que imaginamos) para nos ajudar a levar as pessoas a pensarem, e também nos outros.
Ao autor, o nosso obrigado público e aqui fica o texto, que vale a pena (re)ler…

Memorandum
joão-luís de medeiros
Quem tem medo da coragem...?
...desde jovem tenho procurado escutar o murmúrio coado do pensamento (a pensar não se envelhece) para me proteger da poluição sonora da pregação venenífera dos amanuenses do status-quo. São feitios. É possivel que os desígnios do meu temperamento me tenham protegido das vulnerabilidades da opulência obscena cultivada pelo mandarinismo lusitano.
O saldo da conta da minha rica-pobreza não serve de exemplo a ninguém. Reconheço, contudo, que há ainda vários modos de conviver com a pobreza involuntária; há quem se sirva da pobreza como “alavanca” psico-religiosa para melhor explorar a má-consciência dos herdeiros profissionais das classes possidentes...
O já desbotado decreto emocional de amar os pobres (e odiar a pobreza) já deu provas da sua ineficácia operacional. Não me parece possível eliminar a miséria (a pobreza é apenas o rosto mais visível da miséria) com ferramentas aritméticas, ou seja, duplicando ou triplicando, por milagre populacho, o rendimento individual. Assim que as comunidades acendem o foguete de lágrimas do progresso material, os indivíduos depressa “descobrem” novas, exigentes, quiçá desnecessárias ‘necessidades’. Mais: a trajectória comum dessas supostas necessidades começa como mera ostentação, e termina como imperativo irreversível...
O conceito popular de Democracia “anda nas bocas do mundo” há mais de dois mil e quinhentos anos. Sempre que observamos a fundo o princípio da igualdade na pobreza (em que “o jantar serve de ceia”) ressalta-se-nos à vista o vírus da gripe económica (vamos comparar, metaforicamente, ao vírus da ‘sida social’) cuja propalacão ameaça desaguar no oceano do ‘terrorismo económico’...
Gostaria de acreditar que, no peito da cidadania democrática, há um nobre guerrilheiro-moral a esgrimir a verdade relativa das coisas; um salmo de justiça social patente nas danças e cantares do povo, nas suas emoções e tradições étnico-religiosas. Vamos sugerir que promessas de bem-estar não são juras bíblicas: são porventura gotas de palavras que se esgueiram pelas sinuosidades do eterno-bem; são lascas de verdades arrancadas ao madeiral do pensamento. É por isso que, em pleno esfervilhar da vida, bastas vezes temos de recuar (corajosamente) para tomar fôlego e continuar o avanço (mesmo que paralelamente)...
Vamos perguntar ao Verão em curso: como irás neutralizar a passividade adolescente (e não só) em relação às drogas ilegais? Que novidades trazes aos dois milhões de “fora da lei” que pululam nas cadeias norte-americanas? Qual o teu projecto relativamente ao Serviço Nacional de Protecção às Crianças, para além da contensão disciplinar e da punição legal do imundo flagelo pedófilo? Que me dizes do terrorismo sócio-cultural que continua a adiar sine die a alvorada da meritocracia? Quantos quilómetros de comprimento apresenta a repugnante parada dos mercenários do oportunismo...?
.../.../...
E já agora vamos torcer o leme da diáspora em direcção aos Açores.
Vejamos: quando iremos celebrar o natal da C.O.P.A. (Cruzada de Organização Popular Açoriana), que gostaríamos fosse integrada por Sindicatos, Escolas, Empresas, Organizações desportivas e recreativas, para acicatar a Administração Regional a reconhecer (e a emendar) a sua demorada, embora por vezes compreensível, “dor de ser quase”?  Será que valerá a pena aguardar as melhoras do reumatismo alternativo da oposição regional?  
...creio que nesta conjuntura estival (2010) seria importante “perder a oportunidade para perder a oportunidade”. Ou seja: a autonomia politico-administrativa dos Açores não deve ser humilhada pela hipótese de ser apequenada à mera circunstância dum waiting room for the last trip...  
Caro Verão de 2010: há ainda gente com medo da coragem... e há também muitos viventes apavorados pela chegada da Liberdade (sobretudo pelo temor da responsabilidade individual que tal eventualidade implica...).
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Rancho Mirage, California
Agosto, 2010
Trecho anterior do Blog Comunidades  e foto da autoria de Lélia Nunes daqui
João-Luís de Medeiros é natural da ilha de São Miguel, Açores, e vive nos Estados Unidos desde finais de 1980. Antes de emigrar, trabalhou no sector privado empresarial, e após a instauração da Democracia em Portugal, foi eleito parlamentar à Primeira Legislatura da A.L.R. (Horta, Faial, 1976); mais tarde, serviu como representante açoriano na Assembleia da República (Lisboa, 1978).
As suas publicações em poesia e prosa estão dispersas algures em jornais e revistas da diáspora lusófona. Desde 1976, é colunista-convidado da imprensa comunitária (coluna Memorandum). É co-autor do livro "Em Louvor do Divino" (1993); recentemente, publicou o seu primeiro livro de poemas intitulado "(Re)verso da Palavra" (2007).
João-Luís de Medeiros é licenciado ‘cum laude' em Humanidades e Ciências Sociais (University of Massachusetts, Dartmouth); mais tarde, obteve o Mestrado em Ciências de Recursos Humanos (Chapman University, Orange, California).
Texto de apresentação de Lélia Nunes

2 comentários:

Lélia disse...

Senhor Miguel Loureiro

Fico contente em saber que a crônica do João-Luís foi publicada no espaço do Rotary Club da Póvoa de Varzim. Socializar e partilhar dois verbos fundamentais na convivência social. O Comunidades em dois anos de existências e 550 post publicados cumpre a sua parte.
Para esclarecimento dos leitores é bom informar que o texto é oriundo do BLOG Comunidades,de responsabilidade das signatárias:Irene Maria Blayer(Brocku University,Canada)e por mim (Lélia P.S.Nunes,UFSC,Brasil) e está sediado no site da RTP-Açores.Integramos um grupo de Blogues da RTP-Açores.
Peço a gentileza de divulgar ou fazer o link do nosso Blog Comunidades (ww1.rtp.pt/icmblogs/rtp/comunidades). E também dar crédito a foto e ao texto de apresentação do escritor que são de minha autoria.
Obrigada por sua atenção.
Sempre às suas ordens para futuras colaborações e intercâmbios culturais.
Um abraço fraterno,
Lélia Pereira da Silva Nunes
http://ww1.rtp.pt/icmblogs/rtp/comunidades/
http://videos.sapo.pt/6nGTD4K14s9OUiMPti3E

Contra.facção disse...

Dra. Lélia Nunes
Já está tudo nos "conformes" e já estava, excepto a autoria da foto, porque não tinha a referência.
Espero bem que haja outras colaborações, para bem de ambas as partes, desde que os temas se enquadrem nas margens de intervenção do Rotary Internacional.
Como este ano é o Ano Europeu da Exclusão(?) da Pobreza e o Ano Internacional de Aproximação de Culturas e para o ano, o Ano Internacional do Voluntariado, fácil é haver pontos de aproximação e podermos ser mais um veículo de ligação das comunidades, não só a açoriana, mas sobretudo lusófona.
Obrigado pela colaboração e pela simpatia.